No Sertão Paraibano, em breve, um radiotelescópio será instalado para que cientistas possam conhecer ainda mais, e melhor, o céu brasileiro. Chamado de BINGO, o projeto (que está sendo construído em São Paulo) tem como objetivo principal entender melhor a matéria e a energia escura do espaço. Mas qual a diferença entre uma e outra? Coordenador do projeto, Elcio Abdalla, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) explica.
“Ambas se referem a objetos que não podem ser vistos, elas não interagem com a luz, portanto não transmitem informação eletromagnética. A informação eletromagnética é, na verdade, tudo o que podemos ver. As outras interações, se houver, não estão facilmente ao nosso alcance”, conta.
Mas porque é tão importante conhecer essa parte do Universo e, principalmente, quais os benefícios que isso pode trazer? Segundo Abdalla, essas respostas não podem ser vistas de forma tão simples ou prática. O fato de conhecermos quase nada dessas áreas abre um leque também de possibilidades, por exemplo, do que podemos encontrar lá. “A solução para algum problema nosso pode estar lá. A história da humanidade é feita não pela curiosidade sobre o que está óbvio, mas por tudo aquilo que não podemos ver também, pelo desconhecido”, afirma.
O que é o setor escuro, quais suas propriedades, são perguntas que devemos responder se quisermos conhecer, e eventualmente utilizar, os segredos ali dormentes. Quais são? Ninguém sabe, e ninguém saber não é ruim, pelo contrário, significa que pode ser algo grandioso e não sabemos ainda. Se há uma economia ali escondida não sabemos, mas a aplicação de recursos é ínfima em relação ao que podemos obter. Veja como os Estados Unidos cresceram fazendo ciência. Veja como a civilização mudou nos últimos 300/400 anos desde a revolução científica.
Mas afinal, qual a diferença?
Os nomes, diz Abdalla, são “fantasia”. Isto porque em princípio, matéria e energia são equivalentes, mas neste caso, a matéria escura foi assim chamada porque ela é pesada, então acaba por nos lembrar de algo tenso, rígido. “Nem isto é verdade, em princípio poderia ser mesmo um líquido transparente pelo qual passamos sem nos apercebermos da sua presença. A única interação seria a atração gravitacional. No entanto, se passarmos por, digamos, uma piscina de matéria escura, pode ser que nem a percebamos, passamos incólumes por ela, ou seja, “não nos afogamos”. Este é o entendimento atual que temos sobre matéria escura, pode ser que seja simplesmente isto”, pontua o professor.
A energia escura é “ainda mais misteriosa”. Se ela for mesmo apenas uma constante cosmológica, jamais a perceberemos de perto. Mesmo de longe, o que sobraria dela seria a aceleração, uma espécie de repulsão (é mais tênue ainda que isto!).
O problema é que tudo isto ainda é especulativo, a verdade é que ninguém sabe, e estes são apenas modelos que funcionam, mas o fulcro da questão, ou seja, o que são a matéria e a energia escura é a grande questão que ninguém pode responder hoje.
Benefícios contínuos
Além de ciência e aprofundamento sobre o céu brasileiro, o BINGO trará outros benefícios para o país, explica Abdalla. “Há a tecnologia que virá como consequência. No caso da astronomia e do conhecimento intrínseco da matéria, temos, primeiramente, a tecnologia que vamos desenvolver ao construir o aparelho. Já estamos fazendo isto ao construir as cornetas, por exemplo. A companhia que está fazendo isto, é uma metalúrgica que está adquirindo outros conhecimentos técnicos. Teremos muito mais em conhecimentos em eletrônica, ou mesmo em construção”
A exploração do espaço é algo que deve ser feito cedo ou tarde, afirma o professor: “sem dúvida por esta ou pela próxima geração”, afirma. “Para explorarmos o espaço devemos conhecê-lo. Vamos nós, no Brasil, ficar novamente na retaguarda, ou vamos fazer algo? Para fazer algo e estar na vanguarda dos conhecimentos e de seu uso, devemos agir e participar”, complementa Elcio Abdalla.
Sobre o Projeto Bingo
O BINGO é um projeto internacional, liderado pelo Brasil, para a construção de um radiotelescópio no município de Aguiar, no sertão da Paraíba. Esse telescópio tem o objetivo de estudar cosmologia e astrofísica usando a faixa de rádio, inaugurando uma nova janela de observações do nosso Universo para desvendar algumas questões em aberto na cosmologia e astrofísica, tendo um importante papel nas novas descobertas.
Com tecnologia predominantemente nacional (USP, INPE e UFCG), o BINGO representa um importante projeto para a ciência brasileira com colaboração internacional da China e Reino Unido e com pesquisadores independentes dos Estados Unidos, Coréia do Sul, França, Alemanha, Itália, Espanha, África do Sul e Suíça.
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