Exposição celebra personagens e narrativas pouco exploradas na história oficial do Brasil
Vinícius Vaz de Oliveira nasceu em Brasília em 1996. Graduado em Arquitetura e Urbanismo pelo Iesb, ele encontrou cedo seu caminho na arte, fascinado pela obra A Noite Estrelada de Van Gogh ainda aos seis anos. De lá para cá, ele mergulhou em uma jornada artística influenciada por figuras como Burle Marx e Athos Bulcão, além de grandes ícones da música brasileira, como Tom Jobim, Elis Regina e Renato Russo. Morando no Rio de Janeiro desde 2022, onde pintou grande parte das obras que estarão expostas, Vinícius combina as referências de sua ancestralidade indígena e negra para criar uma pintura que transcende o tempo, conectando o público a um Brasil profundo, em sua complexidade e beleza cultural.
Agora a Galeria Mercato recebe, no dia 29 de novembro, em Brasília a primeira exposição individual de Vinícius Vaz. Em “A História que o Brasil Não Conta”, o artista apresenta 16 pinturas que revelam personagens e temas muitas vezes ausentes dos livros de história, evocando as vozes e presenças fundamentais na formação da identidade brasileira.
Com inspirações no grandioso carnaval carioca e nas religiões que moldam a cultura do país, as obras de Vinícius resgatam as culturas indígenas, afro-brasileiras e o catolicismo sob um olhar sensível e inovador. Em cada uma das obras, Vinícius Vaz explora personagens dos povos originários que habitaram as terras brasileiras antes da chegada dos colonizadores, além de abordar o impacto de religiões como o catolicismo, imposto aos indígenas, e as crenças afro-
brasileiras trazidas por povos escravizados.
A inspiração para o projeto também vem de ícones da cultura popular, como os que foram cantados no samba-enredo da Mangueira de 2019, “Histórias Para Ninar Gente Grande”, que em um de seus versos declara: “Brasil, meu dengo. A Mangueira chegou. Com versos que o livro apagou. Desde 1500 tem mais invasão do que descobrimento. Tem sangue retinto pisado.
Atrás do herói emoldurado. Mulheres, tamoios, mulatos. Eu quero um país que não está no retrato”. “A exposição busca narrar uma história de personagens humanizados que foram além dos estereótipos para se tornarem símbolos de manifestação e representatividade”, afirma Vinícius, que além de tinta acrílica também usa folha de ouro em suas obras.
Os sócios da galeria Antonio Aversa e Roberto Corrieri expressam uma grande satisfação em lançar o trabalho de Vinícius. “A Mercato se propõe a apresentar artistas de diferentes gerações, e é um privilégio poder exibir o trabalho desse brasiliense, descendente dos povos originários, que com cores vibrantes e traços impactantes já começa a conquistar
reconhecimento”, faz questão de afirmar Aversa, que também assina a curadoria da mostra.
Em entrevista exclusiva ao Pluminews, Vinícius nos conta um pouco mais sobre sua trajetória e projetos futuros:
Como você começou a pintar?
Costumo dizer que desde os 5 anos, onde tenho a clara memória dos meus pais me dando tintas guache e um caderno de desenho. Era bem curioso, então fazia questão de misturar as cores para ver o resultado e a mágica acontecer. Conforme o passar dos anos, evoluiu para tinta tecido (transição da infância para adolescência) onde buscava observar figuras ou cenas e passar para a superfície da tela. E é na passagem da adolescência para vida adulta que me consolido com a tinta acrílica e uma visão mais madura do espaço, começando com cenas de Brasília e hoje retratando os Povos Indígenas.
Como seus temas são escolhidos?
É uma pergunta interessante! Os temas surgem como “insights”, pode parecer complicado o entendimento, mas acontece de forma abstrata e a qualquer momento. Pode vir através de algo que eu acabei de ver ou ouvir e a partir daí, minha cabeça vai construindo referências e chegando em um resultado. Um exemplo para esta exposição é algumas pinturas ter como referência músicas (MPB) e sambas de Carnaval, ao escutar vem instantaneamente a imagem em minha mente. Mas não é uma regra que acontece sempre, posso tambem ouvir algo contado por uma pessoa ou ver uma cena que vira um gatilho para a ideia/tema ser criado em minha mente.
Para você, qual a importância do resgate cultural brasileiro?
O Povo originário é a raiz da terra, uma raiz que não foi totalmente descoberta ainda e que na verdade nossa cultura é uma grande desconhecida. A medida que os povos foram chegando aqui, a formação do Brasil em si que é muito posterior à existência dos Povos Indígenas, é que temos uma influência direta. O povo negro escravizado que nunca foram aceitos e que até hoje há um preconceito na religiosidade ou da própria cultura trazida de fora e até mesmo na culinária, teve uma contribuição também no que somos hoje. Muitas vezes as pessoas não tem noção de onde veio um determinado tipo de preparo da nossa comida, qual a raiz, de onde veio?! Uma simplicidade tão saborosa que nós temos; A “pele branca” que chegou até aqui trazendo muitas coisas e que tambem é um tipo de formação, não nos apresentou uma cultura propriamente dita e que influenciou também em certas maneiras e modos. Sendo assim, os Povos Indígenas tinham sua própria cultura uma forma de viver e quando os outros povos foram trazidos, é neste ponto em que temos a formação da cultura do Brasil. E hoje o que é chamado de cultura dentro Brasil, o carnaval e manifestações folclóricas por exemplo e que são extremamente importantes, foram se perdendo no caminho não mantendo a raiz que tinha. Aproveitando o exemplo do carnaval, o batuque do samba de hoje já não tem mais o batuque original. É um assunto que é bastante extenso, então resgatar, saber de onde nós viemos e o que se passou no meio de tudo isso é algo de uma importância fundamental sabendo que hoje vivemos uma outra época. Assim como diz a Deputada Indígena Célia Xakriabá, “antes do Brasil da coroa, existe o Brasil do cocar”, apreservação da nossa cultura é necessária, é a nossa identidade.
Você une três temas nessas pinturas: como eles convergem?
No momento em que a figura central do indígena começa a fazer parte da religiosidade trazida pelos africanos, onde também já existia o espiritual nos Povos Originários em seus rituais. Estes, neste momento também são incluídos, junto a cultura africana e consequentemente na aceitação ou não da religiosidade imposta e trazida pelos brancos, começam a convergir a favor na valorização dos Povos Originários. Então a partir do momento em que todos se integram e forma o traço de identificação brasileira, se tem a convergência de todos eles, onde não há como separar o indígena, o preto, o branco, um momento em que todos se identificam como algo chamado Brasil. Este inclusive é uma coisa criada, o Brasil não nasceu Brasil, o nome “indigena” também foi criado, mas o Povo Originário estava lá e então passa a fazer parte disso tudo a medida que se reconhece todo caminho que percorreu, em todos os campos faz parte dele e não da mais para poder isolar.
Você já tem um novo projeto?
Sim, tenho! Ainda é tudo um segredo e em fase de construção (risos), mas neste novo projeto buscarei trabalhar novas técnicas e quem sabe novos materiais como a cerâmica por exemplo. Quero algo diferente, mas mantendo a essência que são as pinturas sobre tela. E a história por trás vem novamente em forma de homenagem mas narrando sofrimento, alegrias, conquistas de um povo que ajudou a construir nossa cultura e identidade. Quero continuar dando destaque também aos Povos Indígenas, há muita riqueza que ainda não fora mostrada ou contada.
Serviço
Exposição: A História que o Brasil não Conta, de Vinícius Vaz
Onde: Galeria Mercato + Antiguidade + Design, Mezanino do Edifício Eldorado, no Conic Data:
Data: De 29 de novembro a 28 de fevereiro
Horário: Visita com hora marcada através do instagram @espacomercato ou pelo telefone 61
9991482082
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